Arquivo de Junho 2009

Comemoração do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas no Ceará

Junho 10, 2009

Comemoração do DIA DE PORTUGAL, DE CAMÕES e DAS COMUNIDADES PORTUGUESAS no Ceará.
Maria Beatriz Rosário de Alcântara (*)

Felizes aqueles que, como Ulisses, fizeram uma grande viagem e ao retornarem encontraram boa acolhida.

Meus irmãos e eu fizemos uma grande viagem, ainda muito pequenos saímos do Brasil e fomos morar em Portugal, com nossos Avós tão queridos, Maria Augusta da Fonseca Rosário e José Augusto Rosário Dias, os dois oriundos da pequena aldeia serrana da Benfeita, concelho de Arganil, mas naquela ocasião já a residir em Lisboa.

Infância alegre, acarinhada por todos da família. Em julho, férias na Costa da Caparica, agosto e setembro temporada entre as matas de pinheiro bravo e carvalhas, sob os encantos lúdicos do rio Alva e a brandura salutar no convívio com parentes e amigos na vila de Arganil. Felicidade!

Quero as vinhas avermelhadas
o sino no campanário a tocar casamento
a doidinha de Avô a meter medo
as brincadeiras no Jardim Condessa das Canas.

Quero as andorinhas voando rasteiras
na tarde abafada e rubra
o cheiro forte da mata
a sopa de feijão-verde a fumegar.

Quero o milho-rei na desfolhada
mergulhos no rio Alva
a casa do Sapatinho cheia
com risos no espelho de Veneza.

Quero a Feira do Mont’Alto
as músicas do Zé Carlos ao piano
o cheiro de terra úmida
nas comédias da cave das batatas.

Quero ainda as náuseas na aurora
sobre óleo de rícino com café,
mas quero não menos,
amar no amanhã os vestígios do presente.

 

Em outubro regressávamos todos a Lisboa. Havia estudos para a miudagem e trabalho para os chefes da família. Morávamos num bairro inteiramente novo, enfoque e conceito arquitetônico diferentes, um espaço acabado de ser construído, o Arieiro, e nós os Rosários, como uns dos primeiros moradores da Praça João do Rio.

Meu pai querido e saudoso, José da Fonseca Rosário Dias, queria-nos, seus pais e filhos, no melhor da vanguarda daqueles tempos. Vivência de dias encantadores! 

Versos não me cansam de chegar, junto a lágrimas, em cada visita melancólica que por aqueles lugares eu faço, ainda hoje, em toda viagem a Portugal.

Poetas errantes

I

Pedras portuguesas
passos outros no passado
Praça João do Rio
árvores e bancos
chafariz e fonte
visão presente
guardado no jamais
prazer envolto em dor.
Do ontem completo
permanecem vestígios
a Pastelaria Anabela
hoje com almoços rápidos,
no prédio cinco, no segundo direito
as janelas todas cerradas
já não mostram os de lá de dentro
à espera da volta dos meninos
pastas nas mãos vindo da escola,
mas o banco do salgueiro
esse sim, permanece cúmplice,
mantém a mesma sombra
permite leitura, conversas,
estudos ou livre imaginação.
Lágrimas,
saudades escorrem quentes
pelo rosto andeiro,
um corvo entre pombos
penso assim em mim,
súbito, revoam todos os pássaros
pudesse eu voltar
jamais teria seguido viagem
para aos outros não ser estranha
na fala, no vestir, na forma de pensar
às gentes que sinto minhas
de minha raiz. 


II

Tarde quente,
o vento levanta-se
varre as folhas
arrasta um arrepio
sob um sol a permanecer
Insistente na brandura.
Apercebo-me dos versos
“alma minha gentil, que te partiste”
mas tolice, a praça pertence
a outro poeta, João do Rio,
morada de um vivo e bom poeta
Manuel Alegre, com poema mais além
numa pedra cinza do jardim e,
depois dos dois, eu, a desconhecida.
Naqueles jardins muito aprendi,
livros e revistas emprestados
à Biblioteca Jardim da Praça,
pulos ritmados de corda e macaca
num céu amarelo de pedrinhas,
brincadeiras, bulhas e quedas de patins,
“pico, pico, maçarico
quem te deu tamanho bico”
correrias imediatas a dar ao pé.
Nos santos populares, festejava-se
Sto. Antonio em altar com degraus,
São João lançávamos fogos da varanda
a São Pedro, arribávamos
todos nós miúdos em férias.
O vento afasta o sol
rosto e mãos esfriam
reparo que criei crostas
por sobre feridas e perdas
julgadas e tidas como cicatrizes.
Triste fado de quem cuida regressar
longe do afeto na família que se foi
reconhece serem outras suas diretrizes,
isolamento consolidado por tempo e distância,
que nem à saudade se permite mais alcançar. 

Um dia decidi: vou ao Brasil ! E não vai passar desse ano. Era o fim do ano de 1963.

Coração acelerado, cheguei a Fortaleza. Encantamento por sobre cada encanto! Cidade inteiramente plana, dois ou três prédios altos no Centro, calor ameno, brisa suave, pessoas acolhedoras, música envolvente, frutas de perfume e sabor incalculável, árvores frondosas de sombra macia, céu quase sempre azul, águas do mar mornas, areias brancas e finas, gente sorridente e descomplicada, casas brancas pitorescas, peixe fresco todo fim de tarde nas jangadas da praia, luaradas de jovens pela lua cheia à beira do mar, tertúlias semanais nos elegantes clubes sociais, digo-lhes, Senhoras e Senhores, um sonho tropical impossível de ser imaginado por uma jovem de hábitos severos lisboetas, ainda que muito sonhadora.

Não voltarei, está decidido, aqui vai ser minha nova morada! Vou estudar, fazer uma carreira, ensinar e viver para a Literatura. Entrei no Curso de Letras da Universidade Federal do Ceará. Meu Pai não gostou da escolha, como podes teres estudado tanto e apenas vir a ser professora? Fui ser professora, sim, e fui imensamente feliz!

O tempo do amor chegou, casei-me com o jovem médico Lúcio Gonçalo de Alcântara e com ele construímos uma família de harmonia. Vieram dois filhos, Maria Daniela Rosário de Alcântara e Leonardo Rosário de Alcântara, os meus dois meninos, meu encanto maior, orgulho e fortuna.

A política entrou na nossa casa e dela não vou falar, porque não consigo entendê-la e nem me veio trazer momentos felizes.     Contudo, da minha união com a família Alcântara só tenho a lembrar vivências completas de concórdia e querer bem.  Aprendi a reconhecer e viver dentro dos usos e costumes cearenses, a interpretar a sabedoria das pessoas simples do interior, aceitando o sentido das coisas fortes da terra seca. O sertão me foi herdado.

Terra de aboio

Cai o calor e a tarde,
o homem do alto do cavalo
solta o canto
arrodeia e tange o gado
refazendo o caminho
de areia batida
seixos
cercas
garranchos
e mandacarus.
O homem alteia o aboio
o gado satisfeito geme,
caminho de respostas
sob céu sem nuvens.
Na passagem da manada
pedras e rochas estremecem,
acorre o vaqueiro a galope
porteira
sombra do jatobá
casa branca
telhado escuro.
O aboio
cada vez mais forte
anuncia a chegada.
Os olhares se cruzam no alpendre
a comitiva segue
quintal adentro
tamarineira
cercado de cabras
ciscado de galo e galinhas
tudo atento à boiada.
Nova porteira
boio curto
curral
o homem e seu cavalo
recolhem os mugidos
e a tarde fugidia
atenta à chegada da escuridão
permite o silêncio
o sino
o toque dos anjos
agasalhando devoção. 

Senhoras e Senhores, não pretendo mais alongar-me nesses minutos que foram concedidos. 

Minhas palavras finais da noite dirigem-se, primeiramente, para felicitar nosso ilustre ex-consul honorário de Portugal no Ceará, Dr. Carlos Pimentel, a quem a comunidade lusa do Ceará tanto deve pela atividade exercida com empenho e que hoje comigo divide a tão significativa homenagem a nós concedida pela Comunidade Portuguesa no Ceará.

Em seguida, desejo agradecer a todas as mulheres valorosas e fortes com quem convivi no meu trajeto de vida e que se ensinaram, pelo exemplo de conduta determinada, a mestria de ter nas mãos seu próprio destino, modelos salutares que procurei seguir, cabeça erguida (aqui e ali um pouco mais baixa), mas sempre convicta do caminho que tracei para seguir vida afora, tentando muito. muito e muito, não perder a ternura, nem fugir à emoção, segurando firme o entendimento, o carinho pela humanidade e a gratidão pelo bem recebido.

Bem haja a todos, no dia da Pátria de Camões e das Comunidades Portuguesas no ano de 2009, ocasião em que é conferido pelos mais altos representantes locais da Comunidade Portuguesa o I Troféu Martim Soares Moreno, em reconhecimento a trajetórias pessoais voltadas para o estreitamento das relações entre o povo, a cultura e os negócios do Brasil e Portugal, representado no marcante trabalho artístico levado a efeito pela talentosa artista Emília Porto, como eu, uma luso descendente e brasileira amiga das nossas duas pátrias.

 Boa noite e muito obrigada!

(*) Este discurso foi proferido pela escritora e professora Drª Maria Beatriz Alcântara, no decorrer das manifestações do dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, em Fortaleza. 

Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas

Junho 10, 2009

por Teodoro A. Mendes (Tamen)

Retrato de Camões - fonte: ACEAV (www.aceav.pt)

Retrato de Camões – fonte: ACEAV (www.aceav.pt)

Dia de Camões

Tendo origem nos trabalhos de ordem legislativa subsequentes à proclamação da I República, em 1910, no dia 12 de Outubro daquele ano foi publicado um decreto orientador dos novos feriados nacionais que eliminou alguns, especialmente os de ordem religiosa, tendo-se dado naquele Decreto-Lei a possibilidade dos municípios escolherem um dia do ano enraizado nas suas festas tradicionais.

Esta abertura levou Lisboa a escolher para feriado o dia 10 de Junho em honra de Luís de Camões, tendo como base ser  a data do falecimento do grande Poeta, cujo génio representava Portugal, muito embora os republicanos à época fizessem desse feriado uma habilitação de ordem local, portanto, com incidência exclusiva no município de Lisboa., honrando, desse modo o que acontecera nas comemorações camonianas de 1880, em tempo da monarquia constitucional.

Dia de Portugal e da Raça

O dia 10 de Junho veio a encontrar uma exaltação especial com o advento do Estado Novo, em 1933, já com a direcção absoluta de António de Oliveira Salazar, que, embora mantendo o “Dia da Camões”, tendo-lhe dado âmbito nacional, lhe acrescentou o epíteto “Dia de Portugal e da Raça”, tendo isto sucedido no dia da inauguração do Estádio Nacional em 1944.

Com esta designação prosseguiu assim até ao dia 25 de Abril de 1974, com a variante de em 1963 se ter tornado uma homenagem às Forças Armadas Portuguesas, numa glorificação da guerra e do poder colonial.

Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas

Utilizando uma filosofia diversa a Terceira República converteu-o no Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas em 1978.

Este ano, assinala, que pela primeira vez este Dia seja festejado na capital do Ribatejo, a cidade de Santarém, um velho povoado cuja história remonta ao séc. VIII a C. e cuja população se teria integrado no colonizador romano no tempo que este ali chegou em 138 a. C., tendo colaborado e aceite a primeira designação que lhe foi dada: “Scallabis”, nome por que se tornou conhecido um importante porto comercial do rio Tejo e, mais tarde, um dos mais celebrados centros administrativos da velha Lusitânia.

Durante a ocupação islâmica que se seguiu por quatro séculos, a urbe viu consolidado o seu papel estratégico-militar, cultural e artístico, albergando em si gradas figuras do mundo árabe.

Conquistou o primeiro foral em 1095, concedido pelo rei Afonso VI de Leão, tendo finalmente sido reconquistada em 1147 pelo nosso primeiro rei, que lhe deu novo foral em 1179.

O Dia 10 de Junho, perdeu, na actualidade, o sobrenome que já teve e que o identificava, alçando a Raça portuguesa, que hoje, segundo alguns é uma expressão pouco compatível com os valores de Abril e o regime democrático, como aconteceu dizer-se em 2008, quando o Presidente da República no seu discurso, disse: Hoje eu tenho que sublinhar, acima de tudo, a raça, o dia da raça, o dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.

É lastimável que Portugal se esteja a deixar adormecer quanto aos valores que estão na base da celebração deste Dia, de que resulta que todos os portugueses que foram educados nas escolas  públicas – e não só  –  após o 25 de Abril, não só desconhecem Camões, ou quem foi o Padre António Vieira e outros vultos ilustres e, muito menos, sabem o que representou e devia representar para o Mundo o universalismo português, pelo facto de desconhecerem “os Lusíadas”, pois só com muita dificuldade integram o seu autor, que é uma figura universal, na História de Portugal.

Deve assinalar-se que Camões, que figura como patrono do Dia 10 de Junho desde a sua implantação, foi um deserdado do poder coevo que o desterrou durante 17 anos para as paragens inóspitas do Oriente, onde ele “pobre como Jó”, apesar disso, do abandono e da miséria não esqueceu jamais a Pátria, cantando para que o Mundo soubesse, as glórias das figuras maiores de Portugal e, sobretudo, tendo dado um ênfase especialíssimo à gesta dos Descobrimentos, que eternizou a memória grata de todos aqueles que se foram da lei da morte libertando, com a mira apontada para Vasco da Gama.

Celebrar, hoje, este Dia, apesar das lamúrias dos que não gostam que a “Raça”seja algo que deve estar subjacente à memória de um povo que alargou o conhecimento dos Continentes, deve continuar a ser um motivo de exaltar a força de  um colectivo pequeno mas cheio de qualidades.

Num tempo padrasto em que as glórias portuguesas parecem esfumar-se na grande loca do tempo e no esquecimento dos homens, é de louvar que haja um Dia propício para homenagear os que sobressaem da vulgaridade, dando-se azo a que seja lembrado o nome glorioso de Camões, como exemplo do homem que embora esquecido na época em que viveu, na qual a pobreza material o acompanhou como fadário, sem deixar de  fazer dele o paradigma de um povo virtuoso – que nunca foi rico – mas que deu mais coisas ao Mundo do que dele recolheu.

Homem sofrido pelo abandono forçado da Pátria, mostrou, como apesar de todos os desencantos que certamente não deixou de contar, ainda assim encontrou força para cantar em versos imorredoiros as figuras gradas da nossa História, de onde sobressai a gesta hercúlea dos Descobrimentos, glorificando os heróis dos mares que romperam os monstros das ondas e todos os Adamastores, contra todas as lamúrias dos velhos do Restelo.

E é, neste contexto que os versos de outro Poeta, Manuel Alegre – felizmente, entre nós – se agigantam, porque é preciso que no Dia 10 de Junho o povo que somos, se lembre, que a determinação, a força e o arreganho dos nossos avoengos, são leiras onde havemos de continuar a deitar a semente, neste País pequeno, que não pode nem deve deixar que a memória se apague, porque é preciso e urgente continuar a viagem, até, porque somos, um

PAÍS DE MUITO MAR

Somos um país pequeno e pobre e que não tem
senão o mar
muito passado e muita História e cada vez menos
memória
país que já não sabe quem é quem
país de tantos tão pequenos
país a passar
para o outro lado de si mesmo e para a margem
onde já não quer chegar.
País de muito mar
e pouca viagem.

Lembrar, hoje o dia 10 de Junho, faz, pois, todos o sentido, porque, como diz o Poeta temos muito passado e muita História e cada vez menos memória e um dos grandes motivos é que o povo volte a saber quem é, não só por aquilo que foi, mas pelo que tem de voltar a ser – e não – olhar o ver o país a passar para o outro lado de si mesmo e, sobretudo, porque não podemos, sem nos demitirmos da nossa secular História, passar para uma margem, onde parafraseando Manuel Alegre, até parece, que é um destino onde já não queremos chegar.

É urgente voltarmos a saber quem somos e o que fomos e ter orgulho na Pátria que destina um dia para lembrar os que, na actualidade, merecem ser distinguidos com exemplo a seguir pela colectividade.

Somos, efectivamente, um País pequeno e pobre e que não tem senão o mar, mas que, tendo um dia partido à aventura,  enriqueceu o mundo e é, este facto, que tem de continuar a ser exaltado no Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, este ano, em Santarém, cidade altaneira que é um livro de pedra, carregado de história, que vale a pena recordar no traço largo que este apontamento permite.

Recuando no tempo, sabe-se que a altaneira fortificação  “Praesidium Julii” [1]  teria sido em parte muralhada, defesa destruída e reconstruída pelas sucessivas intervenções guerreiras dos Suevos, Visigodos e Árabes, do século V ao século VIII, e em 1147, quando D. Afonso Henriques empreendeu a sua conquista já existia, além dessa muralha, o castelo e a alcáçova.

No tempo de D. Fernando, deve-se a este monarcas a ampliação do muralhamento primitivo e a reforma de portas, como a de Santiago com a sua ogival, tendo D. João IV e mais tarde D. Miguel, promovido a realização de algumas obras no conjunto defensivo.

Ir, pois, comemorar o Dia 10 de Junho a Santarém é, igualmente, um modo de dar sentido e memória do povo que somos e que se revê na astúcia do cavaleiro Mem Ramires que o rei Afonso mandou para estudar o plano de assalto à cidade, em poder dos mouros, o que aconteceu em 15 de Março de 1147, tornando-se Santarém a primeira cidade a ser conquistada, no tempo histórico em que estava em marcha a Reconquista Cristã.

Santarém é uma cidade intrometida na História de Portugal, registando-se o facto do seu castelo em 1245 ter sido dos primeiros a reconhecer o infante D. Afonso – que viria a ser Afonso III – como regente do Reino por incapacidade do irmão, D. Sancho II, deposto pelo poder papal, reforçando o seu papel interventivo no século XIVe de apoio, aquando da revolta em 1324 do que viria a ser o rei D. Afonso IV, contra seu Pai, D. Dinis, que ali faleceu no ano seguinte.

Assistiu, impotente, ao refúgio que se viu forçada a dar à rainha viúva Leonor Teles, sofrendo a afronta do seu castelo ter alojado as tropas castelhanas do rei consorte de D. Beatriz, que só foram expulsas em 1385, após a batalha de Aljubarrota. Em tempo mais recente, Santarém e o seu castelo foi reduto das tropas de D. Miguel, entre Outubro de 1833 a Maio de 1834.

O castelo roqueiro, emblema de Santarém é a referência histórica que imerge do fundo do tempo para a actualidade, que em boa hora escolheu a cidade, onde Portugal espera ver distinguidos pelo Senhor Presidente da República as figuras, cujo passado hão-de merecer a honra de ser caminho para os portugueses deste tempo e para os vindouros.

Honrar Portugal é um dever, quase sagrado, porque se traça de enaltecer os homens e a sua raça, não como um grupo homogéneo de indivíduos cujos caracteres biológicos são constantes e se conservam pela geração, mas pela arte vivencial de um povo histórico proveniente de cruzamentos rácicos e que da diversidade encontrou ao longo dos séculos, a arte de ser português.

Honrar Camões tem de continuar a ser um dever que nos cabe na transmissão que deve ser feita do seu valor, enquanto um Homem que perante os desaires de um tempo magro soube encontrar a riqueza de servir, porque tendo em vista erguer um padrão eterno à glória da Pátria, imortalizando-a e aos seus concidadãos,  disse: (Canto V, estrofe 100)

Porque o amor fraterno e puro gosto
De dar a todo o Lusitano feito
Seu louvor, é somente o pressuposto
Das Tágides gentis, e seu respeito.
Porém não deixe enfim de ter disposto

Ninguém a grandes obras sempre o peito,

Que por esta, ou por outra qualquer via,
Não perderá seu preço, e sua valia. 

Honrar as Comunidades Portuguesas, devia ser, para além de uma lembrança dos ausentes, uma reflexão sobre cerca de cinco milhões de portugueses que pelos mais variados aspectos, procuram na Europa, nas Américas, na Oceânia e em África, uma vida que a Pátria lhes não soube dar.

Devia ser, ainda, uma reflexão sobre o fecho dos Consulados que ocorreu em 2007, deixando cada vez mais longe os laços com a origem, tendo em conta que os “consulados virtuais”, via Internet, retiram a via directa do encontro e tudo quanto representa de afecto o contacto entre pessoas.

Pese, embora, tudo isto, que é um sinal dos tempos actuais, o que tem de continuar a ficar de pé, é o símbolo da Pátria – focado em Camões – que bem merecia outro tratamento na Escola pública, porque esta não pode continuar a esquecê-lo, enquanto Homem e Poeta, dos maiores que até hoje ergueram os Heróis nacionais como bandeiras honrosas, lembrando-os, ainda que eles, como aconteceu com Camões, não tenham tido enquanto vivos, as honras que lhe eram devidas.


[1]  – Na sequência dos combates travados pelas tribos peninsulares com as hostes romanas invasoras, sequência entremeada de conflitos militares entre caudilhos romanos, mas com desfecho na Hispânia, chegou o ano 90 a. C. em que Caio Júlio César, governador das terras hispânicas a oeste do Ebro, que constituam, na organização romana, a Província Ulterior, se apossou definitivamente de Santarém, e, instalando aqui uma guarnição romana permanente, significativamente lhe mudou para Praesidium Julii a velha denominação Scalabis; significativamente, porque ao facto e ao nome não pode deixar de crer-se correspondente à edificação de fortificações. E quando, o traçado vial cujo desenvolvimento acompanhou a romanização fez passar por ali uma das mais importantes estradas militares da Península – a de Lisboa a Astorga, por Conimbriga, Cale e Bracara – bem se radica a convicção de conservar-se fortificado o morro de Santarém.

O Pe. António Vieira: Imperador da Língua Portuguesa

Junho 10, 2009

Língua Pátria

O PADRE ANTÓNIO VIEIRA. “Imperador da Língua Portuguesa”
João Alves das Neves (*)

Retrato de Pe. António Vieira

Retrato de Pe. António Vieira

O verso que inspira o nosso título é bem conhecido, depois que foi inscrito por Fernando Pessoa no livro Mensagem, servindo com rarafelicidade para testemunhar a admiração do Poeta pelo grande prosador – e é mais expressivo do que muitas páginas, se considerarmos que Vieira foi, indiscutivelmente, um dos mais significativos utentes do nosso idioma.

Já o dissemos por outras palavras e repetimos o que dissemos, no livro breve que publicámos em 1998: “Com uma formação essencialmente luso-brasileira, tanto no domínio religioso como no da formação cultural, António Vieira ( … ) jamais deixou de ser o mais destacado português e brasileiro do seu tempo.” Hoje, como poderemos catalogar esse conceito? Diferentemente, é claro, mas sem omitir a raiz, porque no idioma está a essência de todas as origens culturais.

Indiscutivelmente, António Vieira pode ser apontado como ponto de partida e de reencontro do país que fez mundos novos para o Mundo, de acordo com a dialética camoniana, núcleo de uma comunhão inter-continental e sem quaisquer ressentimen­tos colonialistas, porque não os havia no tempo do que chamamos “Profeta do Novo Mundo”. O historiador João Lúcio de Azevedo, um dos seus principais biógrafos, declarou que António Vieira foi “um filho genial da raça lusa, singular em tudo e, pelo que de sua vida pertence ao Brasil, quase mais lá que da pátria nativa”, enquanto o ensaísta Hernani Cidade o retratou como ” homem de acção por imperativo da própria natureza e por orientação educativa como orador ou epistológrafo, havia necessaria­mente de utilizar a palavra falada ou escrita como instrumento de acção. ‘,’ Por seu turno, Ivan Lins acrescentou que eleJoi o primeiro liberal abolicionista da modernidade.”

Não queremos afastar-nos do tema proposto e observemos o estilista que, longe do púlpito, reformulou magistralmente os Sermões, Gartas, a História do Futuro, a Chave dos Profeta. ete. E confinemo-nos na releitura dos textos em que o idioma a tudo e a todos se sobrepõe, conforme se deduz dele próprio e dos que buscaram interpretá-Io nessa extraordinária dimensão. A obra de António Vieira, ‘:filho peninsular e tropical” foi ao mesmo tempo “original” e “universal” e, mais do que tudo isso, segundo Miguel Torga, ele foi um “misto de génio, mago e aventureiro. ”

Por sua vez, Fernando Pessoa falou ainda mais claramente: “António Vieira é de facto o maior prosador – direi mais, é o maior artista – da Língua Portuguesa. É-o por isso porque o foi, e não porque se chamasse António. O comando da língua-mãe não vem por val’Onia de nomes próprios”. E o Poeta é ainda mais veemente quando, pela voz do semi-heterónimo Bemardo Soares, proclama de forma inequívoca e altissonante:

 

“Minha pátria é a língua portuguesa.” E esta frase, que de tantas vezes repetida já se tornou um provérbio cada vez mais freqüente, vem no Livro do Desassosego depois da confissão: “Tal pagina, até, de Vieira, na sua fria perfeição de engenharia sintática, me faz tremer como um ramo ao vento, num delírio passivo de coisa movida”.

 

Continuando. escreve Pessoa: “Não choro por nada que a vida traga ou leve.  Há porém páginas de prosa que me têm feito chorar. Lembro-me que, como do que estou vendo, da noite em que, ainda criança, li pela primeira vez numa selecta, o passo célebre de Vieira sobre o Rei Saio mão. “Fabricou Salomão um palácio … ” E fui lendo, até ao fim, trémulo, confuso; depois rompi em lágrimas felizes, como nenhuma felicidade real me fará chorar, como nenhuma tristeza da vida me fará imitar. Aquele movimento hierático da nossa clara língua majestosa, aquele exprimir das idéias nas palavras inevitáveis, correr de água porque há declive, aquele assombro vocálico em que os sons são cores ideais – tudo isso me toldou de instinto como uma grande emoção política. E, disse, chorei; hoje, relembrando , ainda choro. Não é – não – a saudade da infância, de que não tenho saudades: é a saudade da emoção daquele momento, a mágua de não poder já ler pela primeira vez aquela grande certeza sinfônica.”

 

Conclui Fernando Pes’soa o seu comentário vieiriano: “Não tenho sentimento nenhum político ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriótico. Minha pátria é a lín~ua portu~uesa. Nada me pesaria que invadissem ou tomassem Portugal, desde que não me incomodassem pessoalmente. Mas odeio, com ódio verdadeiro, com o único ódio que sinto, não quem escreve mal português, não quem não sabe sintaxe, não quem escreve em ortografia simplificada, mas a página mal Escrita, como pessoa própria, , a sintaxe errada, como gente em que se bata, a ortografia sem ipsilon, como o escarro directo que me enoja independentemente de quem o cuspisse.”

 

E conclui o poeta da Mensagem: “Sim, porque a ortografia também é gente. A palavra é completa vista e ouvida. E a gala da transliteração greco-romana veste-ma do seu ver o manto régio, pelo qual é senhora e rainha”. (A ortografia é portuguesa e actualizada).

 

Entretanto, assinala-se que para lá deste comentário que aproxima os dois grandes escritores portugueses, Fernando Pessoa dedicou ao idioma outros trabalhos, conforme ilustra o volume póstumo Língua Portuguesa. organizado por Luísa Medeiros (198 páginas, Lisboa, 1997), no qual se acham outros textos pessoanos sobre “O problema ortográfico” e “Defesa e ilustração da Língua Portuguesa”.

 

o nosso propósito foi o de documentar a importância que o Poeta atribuiu à obra do Padre António Vieira, mas recordamos que vários estudos de outros autores portugueses e brasileiros têm sido consagrados ao mesmo tema. E recomenda-se a leitura da História do Padre António Vieira. de João Lúcio de Azevedo (2 vol,’,., Clássica Editora, Lisboa, 1992). E outras informações podem ser anotadas a partir dos 3 volumes dos Anais do Terceiro Centenário da Morte do Padre Antônio Vieira  / Congresso Internacional ( ed. da Universidade Católica Portuguesa/ Província Portuguesa da Companhia de .Jesus, Braga, 1993)

 

(*) Escritor português radicado há muitos anos no Brasil, João Alves das Neves publicou mais de duas dezenas de livros sobre questões literárias (com relevo para a obra pessoana), preside ao Centro de Estudos Am. Fernando Pessoa (co-fundador em 1987) e foi editorialista do diário O Estado de S. Paulo e professor titular e pesquisador da Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero (São Paulo).

Armando Rocha-Trindade. Pioneiro do Ensino à distância em Portugal

Junho 10, 2009

In Memoriam” 

Armando Rocha-Trindade

Armando Rocha-Trindade

É com grande pesar que a Universidade Aberta (UAb) comunica o falecimento do Prof. Doutor Armando Rocha Trindade (1937-2009), fundador da UAB e seu primeiro reitor, que partiu ao princípio da tarde do dia 28 de Maio de 2009, deixando mais pobre o ensino superior e o País.

Nascido em Lisboa, a 28 de Maio de 1937, Armando Rocha Trindade licenciou-se em Engenharia Electrotécnica, pelo Instituto Superior Técnico (IST), em 1961; doutorou-se em Física, em 1970, pela Faculdade de Ciências da Universidade Paris, tendo-se tornado Professor Extraordinário e Agregado em Física no IST, em 1974 e, em 1980, Professor Catedrático do Grupo de Disciplinas de Física do mesmo Instituto.

Figura que desde sempre se destacou pelo seu interesse pelo Ensino, e pela procura de soluções originais e inovadoras para os problemas educativos do País, Rocha Trindade desempenhou os cargos de Director-Geral do Ensino Superior (1975-1976); de Presidente da Comissão Científico-Pedagógica do Ano Propedêutico (1978-1981); de Presidente do Instituto Português de Ensino a Distância (1980-1988) e de Presidente do Instituto de Tecnologia Educativa (1987-1988).

Dedicou grande parte da década de 80 a actividades relacionadas com a concepção, o projecto e a criação de uma universidade de Ensino a Distância em Portugal, sempre com o objectivo de contribuir para a melhoria dos índices de formação superior de vastas camadas da população portuguesa, apostando em metodologias e instituições que pudessem proporcionar formação contínua e formação superior a adultos, já plenamente inseridos na vida activa.

Na sequência desse seu labor fundou a Universidade Aberta, em 1988, e dela foi Reitor em dois mandatos consecutivos (1989-1994 e 1994-1998), tendo também impulsionado a criação da Universidade Aberta Internacional da Ásia, constituída há 15 anos, em Macau.

Participou igualmente na fundação de algumas das principais redes europeias de educação a distância (como a EDEN – European Distance and E-Learning Network e a EADTU-European Association of Distance Teaching Universities), tendo exercido o cargo de Presidente do ICDE-International Council for Open and Distance Education (1995-1999); de membro do Conselho Executivo da EADTU (1987-1997) e de vice-presidente da EDEN (1990-1998).

Foi ainda membro do High Level Expert Group on the Societal Consequences of the Information Society, da Comissão Europeia (1995-1997), tendo desenvolvido, como perito, numerosos estudos para outros organismos internacionais e governos nacionais.

Armando Rocha Trindade produziu uma centena e meia de contribuições científicas e pedagógicas sobre Educação de Adultos e Educação a Distância, obra que se encontra disseminada em artigos, conferências e livros publicados em Portugal e no estrangeiro.

Foi sócio correspondente da Academia de Ciências de Lisboa, membro convidado do Senado da Universidade do Minho, Assessor para assuntos de Ciência e Tecnologia do Instituto de Defesa Nacional e delegado português junto do Projecto DELTA.

Titular de várias condecorações francesas, das quais se destacam a Ordre des Palmes Académiques (Comendador) e a Ordre national du Mérite(Oficial), foi analogamente Doctor Honoris Causa (Humane Letters) da State University of New York (1997), e da Open University do Reino Unido (1998), Professor Catedrático Honorário da University of External Studies da Federação Russa (1996) e Honorary Advisor da Shanghai Television University, da República Popular da China (1998).

Do mesmo modo, em 2002 foi distinguido com o prémio Robert de Kieffer International Award da Association for Educational Communication and Technology.

O Salão Nobre da Universidade Aberta exibe o seu retrato, brilhantemente pintado por Maluda, em 1994.

No âmbito da celebração do vigésimo aniversário da UAb (2 de Dezembro de 2008 a 2 de Dezembro de 2009), a Universidade Aberta homenageia ainda o seu reitor inaugural com a atribuição do Prémio Armando Rocha Trindade, destinado à melhor dissertação de mestrado sobre Educação a Distância.

Pessoa X Salazar

Junho 10, 2009

Círculo Fernando Pessoa

PESSOA X SALAZAR

capa

Com o titulo de “Fernando Pessoa, Salazar e o Estado Novo” vai ser lançado no mês de Junho, em São Paulo, um novo livro de João Alves das Neves, estudo que terá, além de uma introdução e notas com cerca de 30 páginas os seguintes capítulos: “Cinco poemas políticos” “Salazar, o grande equivoco”; “Interregno-II”, “Fernando Pessoa em 1935/Ditadura e Ditador” e “Ideário político e autobiografias”.

Na 2ª parte, o organizador, com base nos textos pessoanos, apresenta um pequeno dicionário (“As idéias políticas de Fernando Pessoa”). que reproduz dezenas de verbetes sobre os temas: “Anarquia”, “Bolchevismo”, “Censura “, “ColÔnias “, “Comunismo “, “Democracia “. “Fascismo “; “Império “, “Inquisição “, “Integralismo”, “Liberdade”, “maçonaria”, “monarquia”, “Mussolini”, “Nacionalismo “, “Pátria “. “Povo”, “República”, “Revoluções “, “Sebastianismo”, “Sidonismo “. ”Tirania’, “Utiimatum”, etc. E não faltam no dicionário os conceitos assinados pelo autor da “Mensagem”, acerca de Hitler, Lenine e Trotzk, Mussoliniini, Primo de Rivera e Salazar.

Os poemas e prosas de Fernando Pessoa em torno da política estavam dispersos por diversos livros e revistas com relevo para as obras de Joel Serrão e Teresa Rita Lopes, mas só agora foram selecionados e comentados num só livro com as notas e os comentários de João Alves das Neves, autor de mais 6 volumes sobre a vida e a obra do poeta da Mensagem. Fundador de um Centro de Estudos em São Paulo, 1987),  Alves das Neves é um dos 8 coordenadores do Circulo Fernando Pessoa, que edita dois blogs na Internet, voltados para os temas relacionado com Portugal, Brasil, Angola, Moçambique,Cabo Verde, Guiné (Bissau), São Tomé e Príncipe e Timor.

O livro Femando Pessoa, Salazar e o Estado Novo terá uma edição em Lisboa, mas pode ser desde já reservado pela Internet:
www.joaoalvesdasneves.blogspot.com
www.revistalusofonia.wordpress.com.br
– ou por e-mail: jneves@fesesp.org.br

Os 8 Países de Língua Portuguesa Oficial somam quase 250 milhões de pessoas

Junho 10, 2009

Noticiário

OS 8 PAÍSES DE LÍNGUA OFICIAL SOMAM QUASE 250 MILHÕES DE PESSOAS

tabela

O Monumento a Cristo-Rei, em Lisboa, comemorou 50 anos.

Junho 10, 2009

Noticiário

O MONUMENTO A CRISTO-REI, EM LISBOA, COMEMOROU 50 ANOS.

 

Milhares de pessoas participaram, em 17 de Maio último, das cerimônias evocativas da inauguração (hã 50 anos ) do Monumento a Cristo-Rei, voltado para Lisboa, do outro lado do Rio Tejo (em Almada), de onde se desfruta um panorama deslumbrante. Assinala-se que o monumento português foi sugerido pelo falecido Cardeal-Patriarca de Lisboa, Dom Manuel Gonçalves Cerejeira, que se inspirou no Cristo-Rei do Corcovado, no Rio de Janeiro.

Monumento Cristo-Rei, em Portugual

Monumento Cristo-Rei, em Portugual