A ousadia luso-brasileira, na opinião de Luiz da Gama Mór, vice-presidente Executivo e Comercial da TAP
Luiz da Gama Mór, vice-presidente Executivo e Comercial da TAP
A vida do gaúcho de Cachoeira do Sul, 58 anos, engenheiro mecânico licenciado na UFRGS, é dedicada à aviação, apaixonado que é pelas coisas de terra, ar e negócios relativos ao setor. Daí o encaminhamento de pós-graduação em Administração e Marketing, antes dos muitos cursos de aperfeiçoamento como o de Airline Business, pela London Business School. Possui uma experiente trajetória de 23 anos, focada em experiências nas áreas de comercialização, vendas, operacional, aplicando conhecimentos em estratégia competitiva, planejamento, desenvolvimento de produtos e fidelização de clientes. Foram muitos cargos na Varig, onde começou em 1972 como estagiário de engenharia e foi em ascensão, o último posto como vice-presidente executivo de Vendas e Marketing. Também foi diretor da Pluna, trabalhou na Aeromot, foi professor de Ciências Aeronáuticas e de Turismo, e membro do Conselho Diretor da Amadeus.
O executivo personalista cede espaço ao pai atencioso e dedicado que acompanha os filhos distantes, André, em Londres; e Alice, em São Paulo. E que continua uma história amorosa iniciada com a esposa Rosane, e que completou 40 anos agora em 2010.
Ao iniciar a etapa dos 65 anos da TAP, identificada na campanha da empresa, premiada e reconhecida, com projeções afirmativas de recuperação como nos últimos três meses, Mór afirma que pretende um ano de consolidação da oferta da companhia nos mercados internacionais e que pretende transportar 9 milhões de passageiros, um crescimento de 7,1%.
BRASILTURIS JORNAL – 2010 vai completar dez anos da direção brasileira na TAP. Em uma década dá para fazer história?
Dá, e muita. O mundo mudou e os tempos são outros. Quando assumimos a TAP, existiam as torres gêmeas em Nova York. A TAP mudou muito desde então e hoje é uma empresa muito mais forte, bem maior. Crescemos três vezes nestes dez anos. Conseguimos ultrapassar os segmentos, muitos de guetos étnicos que tínhamos, de ser considerada e percebida como uma empresa de segunda linha dez anos atrás. Hoje, somos uma marca que atende todos os segmentos, com um produto jovem, moderno, competitivo e inovador. Somos a primeira empresa aérea a voar para o Brasil com cama na classe executiva, a primeira a operar para mais destinos além dos normais – São Paulo e Rio -, e durante algum tempo, depois de 2001 e na crise, ficamos como única empresa aérea a ter voos diários do Rio de Janeiro para a Europa. Daí dizermos sempre que o Rio é um destino extremamente importante para nós e continuará sendo, ainda mais com a Copa de 2014. O Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas (SP), também será outra inovação como foi voar para Brasília, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Fortaleza, Natal e quem sabe será Manaus, o Norte e também o extremo Sul do País. Temos ainda muito para crescer, mesmo no Nordeste.
BJ – Aviação é uma conquista diária. Não existe, por mais que se possa dizer, a consideração de que aviação é fácil. É sempre difícil, uma empreitada muito complicada. Em época de crise, ainda mais. O ano de 2009 foi o mais difícil, uma travessia complicada. A TAP está preparada para este novo tempo que está começando?
É uma boa questão. Eu fico feliz da maneira como vocês do Brasilturis Jornal colocam isto da conquista diária. Muita gente tem dificuldades desta compreensão e querem que a gente desenhe o futuro de uma forma mais clara. Mais do que nunca, nós temos que ter agilidade. Nós temos um ativo extremamente caro, que tem um custo de operação elevado, com o combustível principalmente, mas não só. Tem operações, pessoal e outros. E por as margens serem muito baixas, não podemos nos dar ao luxo de perder dinheiro. A capacidade de se ajustar a cada momento é muito grande. O futuro tem sido muito incerto, muito mesmo. Quando a gente olha para trás, podemos achar que os eventos foram ótimos, mas quando se olha para a frente não se tem a menor noção. Em meados de 2008 estávamos pagando o barril a US$ 148, diziam que iria chegar a US$ 200 no final do ano. E o que aconteceu? Quando o ano terminou estava a US$ 50. É muito difícil prever. Eu acho que o grande ativo que nos introduzimos na TAP neste tempo que estamos aqui é isso. A compreensão que o mundo é assim, que não conseguimos definir o futuro com precisão, mas temos que ter clareza e objetividade estratégica: o que somos, para onde queremos ir e saber aproveitar quando as oportunidades aparecem. O resto está a cada instante, um pouco daqui e dali.
BJ – A TAP é um desafio maior do que você algum dia imaginou?
Acho que sim. Eu jamais imaginei para ser bem sincero, estar no comando de uma empresa aérea, qualquer que fosse ela, como aconteceu aqui. A TAP era até impossível de pensar, pois jamais imaginei viver fora do Brasil. E os desafios que foram colocados eu também jamais tinha sonhado. Isto é muito motivador (e alarga a voz para dizer o muuuiitoooo). Eu sou uma pessoa feliz. Mesmo com todas as dificuldades do setor, tenho paixão pelo que faço, por esta empresa e pelas pessoas que trabalham nela. Eu tenho paixão pelos projetos que criamos, estou sempre entusiasmado pelo próximo e isso é que dá energia e impulso para seguirmos em frente.
BJ – E a escolha para voar para Viracopos?
Um fruto desta capacidade que nos temos e a coragem de fazer um novo que ninguém fez. Fazer o que deve ser feito para manter a nossa liderança nesta correspondência Brasil-Portugal nos caminhos da Europa. Nos temos ainda regiões brasileiras que a gente gostaria de ter em uma oferta melhor e, que neste momento era o interior do principal pólo econômico do País que nos preocupava, até pelo estrangulamento de Guarulhos (Aeroporto Internacional de São Paulo) e a dificuldade de ali crescer. Nosso ativo competitivo no Brasil é a nossa dispersão por este país continente.
BJ – Para quem tanto conhece o Brasil, você tem a certeza de que o mercado do interior paulista está em festa com esta decisão da TAP?
Eu espero que sim. Isto a gente está fazendo com muito carinho. Nós vamos estar de olho no interior de São Paulo e estados vizinhos. É para o interior que a gente está fazendo isso e queremos estar à altura de atender um mercado que é extremamente exigente, importante e que tem sido deixado de lado. Do interior, ir para Guarulhos (Aeroporto Internacional de São Paulo) para embarcar, na atualidade, é um sofrimento que ninguém merece. Queremos dar uma alternativa melhor e espero estarmos à altura das necessidades do interior.
BJ – A promoção do Brasil no exterior é uma questão que, por várias vezes observamos a sua cobrança, participando diretamente, insistindo, indicando e sem que nunca chegasse ao que você, o profissional, entendesse como necessário. Neste momento de mudança do perfil brasileiro para o mundo, como pensa?
O Brasil mudou muito. E as ações macro-econômicas, políticas e sociais, que colocam o País em evidência, nos ajudam bastante e criam uma extensão deste momento. O Brasil já tem uma marca forte. É impressionante. Digo isso, porque eu também promovo como TAP, Portugal e não só o Brasil. A marca Brasil é muito mais forte. Em qualquer lugar do mundo que se vá, dizendo-se brasileiro, houve uma alteração marcante de conteúdo e significado. Pode ser na China, na Tailândia, na Índia, na Rússia, em qualquer lugar, além da simpatia existente pelo Brasil, isso decorre de um modo natural. Eu diria que até mais do que a gente merece, muitas vezes. As pessoas acham que nos somos gente de bem. Um país alegre, por sua expressão musical, da maneira de ser, do futebol, da jovialidade… Agora é um desafio muito, muito grande. Construir e manter a marca de um país continental, com todas as suas diferenças.
Este novo momento do Brasil também nos enche de responsabilidades. Temos que estar preparados para crescer, atingir regiões cada vez mais longínquas, para o Leste, para a Europa nórdica… Para nós, não existe um Brasil, existem muitos, porque são diferentes, uns que formam um. Evidente que somos uma nação una e temos orgulho do nosso país, mas temos cidades e belezas locais diferenciadas.
O desafio da promoção me parece que ainda não é bem resolvido. Entendo que o Brasil se promove pouco e isso é ruim. Ainda não existe um modelo configurado pela descontinuidade política. Ainda bem que temos uma Embratur que ao longo dos últimos anos apresenta uma coerência e um profissionalismo em suas ações. Nos estados, nem sempre encontro isso, somente em momentos sazonais. Falta uma consistência, comparando-se com a necessidade e aquilo que os competidores fazem. Acho que temos muito que evoluir.
BJ – E Portugal?
Existe ainda, mas cada vez menos, um certo preconceito. Isto está mudando e a gente acha que está ajudando a mudar isso. Este é um país extraordinário, que tem atributos fantásticos para os brasileiros visitarem e, certamente, é a melhor porta de entrada para a Europa.
BJ – E o ano que está começando. Como idealiza, começando pela torcida na Copa, começando por Brasil e Portugal na mesma chave?
(risos)…Aí eu não tenho dúvidas. Sou Brasil na Copa do Mundo, apesar da cidadania portuguesa. Tomara que os dois cheguem à final, mas que o Brasil vença. No ano, acho que nos temos que deixar a crise para trás. Ou pelo menos a primeira etapa, já que esta crise não vai desaparecer neste ano, ela continuará com resquícios evidentes. Chamo deixar a crise para trás, uma recuperação nos grandes centros econômicos. Nos dependemos deles. Tenho extremo otimismo em relação ao Brasil neste ano. Estamos aumentando a oferta de vôos e estou tranquilo em relação a isto. Mas, não digo o mesmo em relação á Europa ou aos Estados Unidos, o que de forma indireta nos atinge. Gostaria que 2010 fosse o início de uma virada sustentada da economia geral mundial.
Matéria publicada no Brasilturis Jornal, dirigido por Horácio Neves.