Arquivo de Abril 2014

A Igreja é contra a teoria da evolução?

Abril 29, 2014

por Felipe Aquino

Evolução-Criação-300x128A Igreja não é contra a teoria da evolução, desde que seja entendido que esta evolução foi querida por Deus, programada e executada por Ele. A Igreja também não abre mão de que a alma humana, imortal e racional, é criada diretamente por Deus e colocada na pessoa no instante da sua concepção, quando o óvulo feminino é fecundado pelo sêmen masculino. Dentro dessa ótica, a Igreja aceita a teoria do início do mundo a partir do Big Bang, a grande explosão que teria dado inicio ao universo hoje conhecido. Mas o que é o Big Bang?

No início do século os astrônomos começaram a mapear o Universo, e descobriram que as galáxias pareciam estar se afastando da Terra com velocidades cada vez maiores, de modo que quanto mais longe estivessem tanto maior era a sua “velocidade de fuga”. Era como se os grupos de galáxias fossem partes de uma explosão acontecida a bilhões de anos. Daí nasceu a teoria do Big-Bang (grande explosão), segundo a qual o Universo começou a partir dos fragmentos desta gigantesca explosão.

A partir das velocidades relativas, observadas nas galáxias mais distantes, a época da explosão foi calculada em aproximadamente 15 bilhões de anos. Uma matéria ultra-comprimida teria explodido numa nuvem de energia e partículas elementares, aquecidas a uma temperatura inimaginável de bilhões de graus Celcius. Dentro desta esfera havia apenas fótons e nêutrons comprimidos de modo tal que um litro dessa matéria pesaria bilhões de toneladas e tinha a temperatura de 1015 (= 1 seguido de 15 zeros) graus C. Essa esfera teria explodido, jogando no vazio a matéria com a velocidade da luz.

Apenas um centésimo de segundo após essa grande explosão, a temperatura descera a 300 bilhões de graus C; os fótons e os nêutrons se condensaram em elétrons e núcleos, dando origem a uma massa de hidrogênio incandescente, que aos poucos foi se condensando em galáxias de estrelas. No interior das estrelas, a cerca de 20 milhões de graus, esse hidrogênio foi se transformando em hélio, num processo de combustão que liberava enormes quantidades de energia. Em seguida, num complexo processo de evolução química, esse hélio se converteu em outros elementos (oxigênio, carbono, nitrogênio, ferro…), que se encontram nas estrelas.

Alguns bilhões de anos após a explosão inicial, originaram-se as estrelas, os planetas, os asteróides e os satélites que constituem o nosso sistema solar e o universo inteiro. Sabe-se hoje que o espaço é perpassado por um campo de radiações, que têm a temperatura de 2,7 graus absolutos (270 graus centígrados abaixo de zero). Essas radiações são o resíduo da radiação muito mais intensa e quente que devia perpassar o universo nas suas fases iniciais de existência. Por efeito do processo de expansão devido ao big-bang inicial, a radiação eletro-magnética originária teve que diminuir a sua temperatura até chegar hoje, 15 bilhões de anos depois, a uma temperatura próxima do zero absoluto.

A presença dessa radiação, que perpassa o universo e que é prevista pela teoria do big-bang, poderia ser a prova mais convincente desta teoria, que ainda não é aceita por todos os astrônomos e físicos. Um pequeno grupo acredita que o Universo é eterno, isto é, não teve começo e nem terá fim. É a teoria do estado constante. A fé não aceita esta teoria, pois a eternidade do Universo faria dele um Absoluto, um Deus. Só Deus é eterno; só Deus não teve começo e não terá fim. O eterno é perfeito; não evolui, como o Universo evolui, teve início e terá fim.

Para os físicos modernos, a melhor explicação da origem do universo está na teoria do Big Bang, que tem sido estudada exaustivamente; e a Igreja não a desaprova, desde que se considere o que foi dito acima.

AS MENTIRAS “VERDADEIRAS”

Abril 28, 2014

por  Ives Gandra da Silva Martins

“Comparado ao carniceiro profissional

do Caribe, os militares brasileiros parecem

escoteiros destreinados apartando um conflito

de subúrbio” in “O homem mais lúcido do Brasil –

as melhores frases de Roberto Campos”, p. 53,

organização Aristóteles Drummond, Ed.

Resistência Cultural, 2014.

Na memória dos 50 anos do Movimento de 1964, que derrubou o governo Jango, em sido ele criticado pelos que fizeram guerrilha, muitos deles treinados na sangrenta ditadura de Cuba e que objetivavam implantar um regime semelhante no Brasil, ao mesmo tempo que se vangloriam como sendo os únicos e verdadeiros democratas nacionais. Assim é que a própria Comissão da Verdade se negou a examinar os crimes dos que pegaram em armas – muitos deles terroristas, autores de atentados a shoppings e de homicídio de inocentes cidadãos -, procurando centrar-se exclusivamente nos praticados pelo governo militar, principalmente nas prisões onde houve tortura.

Com a autoridade de quem teve um pedido de confisco de seus bens e abertura de um inquérito policial militar (IPM), nos termos do Ato Institucional n.º 5, em 13/2/1969, pertenceu à época à Anistia Internacional, combatendo a tortura perpetrada pelo governo, foi conselheiro da OAB-SP, opondo-se ao regime, e presidiu o Instituto dos Advogados de São Paulo na redemocratização, quero enumerar algumas “mentiras verdadeiras” dos adeptos de Fidel Castro recém-convertidos à democracia.

A primeira é a de que foram os militares que quiseram a derrubada do governo. Na verdade, foi o povo que saiu às ruas, com o apoio da esmagadora maioria dos jornais, como se pode ver pelas fotografias do dia 19 de março de 1964 na Praça da Sé, diante das sinalizações do governo de que pretendia instalar o comunismo no Brasil. Depois do fatídico 13 de março, em que Jango incitou os sargentos a se rebelarem contra a hierarquia militar, até mesmo nomeando um oficial-general de três estrelas para comandar uma das Armas, os militares apenas atenderam ao clamor popular para derrubá-lo.

A segunda mentira é a de que a repressão militar levou à morte de milhares de opositores. Entre combatentes da guerrilha, mortes nas prisões ou desaparecimentos, foram 429 os opositores que perderam a vida, conforme Fernão Lara Mesquita mostrou em recente artigo publicado no Estado. Por sua vez, os guerrilheiros, entre inocentes mortos em atentados terroristas e soldados em combate, mataram 119 pessoas.

Comparados com os paredóns de Fidel Castro, que sem julgamento fuzilou milhares de cubanos, os militares foram, no máximo, aprendizes desajeitados.

A terceira mentira é a de que o movimento militar prejudicou idealistas, que só queriam o bem do Brasil. Em comissão pelos próprios opositores do governo de então organizada, foram indenizadas 40.300 pessoas com a fantástica importância de R$ 3,4 bilhões.

Eu poderia ter requerido indenização, pois o pedido do confisco de meus bens e a abertura de um IPM contra mim prejudicaram, por anos, minha carreira profissional. Mas não o fiz, pois minha oposição, à época, ao regime não era para fazer, mais tarde, um bom negócio, com ressarcimentos milionários.

A quarta mentira é a de que os democratas recém-convertidos queriam uma plena democracia para o Brasil. A atitude de “admiração cívica” da presidente Dilma Rousseff ao visitar o mais sangrento ditador das Américas, Fidel Castro, em fotografia estampada em todos os jornais, assim como o inequívoco apoio ao aprendiz de ditador que é Nicolás Maduro, além de aceitar o neoescravagismo cubano, recebendo médicos da ilha – tratados, no Brasil, como prisioneiros do regime, sobre ganharem muito menos do que seus colegas que integram o programa Mais Médicos -, parecem sinalizar exatamente o contrário. Apesar de viverem sob as regras da democracia brasileira, há algo de um saudosismo guerrilheiro e uma nostalgia que revela a atração inequívoca por regimes que ferem os ideais democráticos.

E para não me alongar mais neste artigo, a quinta mentira é a de que o Brasil regrediu naquele período. Nada é menos verdadeiro. Durante o regime militar os ministros da área econômica eram muito mais competentes que os atuais, tendo inserido o Brasil no caminho das grandes potências. Tanto que, ao final, o Brasil estava entre as dez maiores economias do mundo. Hoje, com o crescimento da inflação, a redução do PIB, o estouro das contas públicas, o desaparecimento do superávit primário do início do século, os déficits do balanço de pagamentos e a destruição dos superávits da balança comercial, além do aparelhamento da máquina pública por não concursados – amigos do rei -, o País vai perdendo o que conquistara com o brilhante Plano Real, do presidente Fernando Henrique Cardoso.

O ministro Torquato Jardim, em palestra em seminário na OAB-SP, que coordenei, sobre Reforma Política (2/4), ofereceu dados alarmantes. O presidente Barack Obama, numa economia quase oito vezes maior que a do Brasil, tem apenas 200 cargos comissionados. A presidente Dilma tem 22 mil!

Tais breves anotações – mas já longas para um artigo – objetivam mostrar que, em matéria de propaganda, Goebbels, titular de comunicação de Hitler, tinha razão. Uma mentira dita com o tom de verdade, pela força da propaganda que o poder oferece, passa a ser uma “verdade incontestável”.

Espero que os historiadores futuros contem a realidade do período, a qual não pode ser contada fielmente por “não historiadores” que se intitulam mentores da “verdade”, ou por comissões com esse estranho nome criadas.

Morre o Notável Romancista Gabriel Garcia Márquez

Abril 25, 2014

por Cyro de Mattos

Considerado um dos mais importantes escritores do século 20, o colombiano Gabriel García Márquez morreu  na quinta-feira última,  17 de maio,  aos 87 anos, na cidade do México, vítima de um câncer nos rins. Seu corpo foi cremado em uma cerimônia privada e restrita à família. Metade das cinzas ficou com o México, a outra com a Colômbia, Gabriel Garcia Márquez, chamado de Gabo pelos amigos, nasceu no dia 6 de março de 1928 na aldeia de Aracataca, na Colômbia, não muito distante de Barranquilla.

García Márquez ganhou sucesso internacional após a publicação do romance “Cem anos de solidão”, em 1967. Para o grande romancista peruano Maria Vargas Llosa, o livro foi considerado o maior acontecimento da novela depois de “Dom Quixote”, de Cervantes. Exemplo máximo do realismo fantástico – gênero característico do boom latino-americano da segunda metade do século XX –, “Cem anos de solidão” se passa na fictícia aldeia de Macondo e acompanha, ao longo de gerações, a saga da família Buendía.

Dalton Trevisan, um dos mais importantes autores brasileiros no século XX,  não conteve seu entusiasmo ao ler “Cem anos de  solidão”, chegando a afirmar que  o Brasil merecia um romancista como Gabriel Garcia Márquez. A obra-prima de García Márquez vendeu, até hoje, mais de 50 milhões de exemplares. Foi traduzido para 35 idiomas. Enquanto isso, entre os títulos mais conhecidos do autor de “Cem anos de solidão”, estão ainda  “A incrível e triste história de Cândida Erêndira e sua avó desalmada”, “O outono do patriarca”, “Crônica de uma morte anunciada”, “O amor nos tempos do cólera”, “Do amor e outros demônios”, “Memórias de minhas putas tristes”, “Ninguém escreve ao coronel”, “O Veneno da Madrugada” e “Olhos de cão azul”.

Sobre “O amor nos tempos do cólera”, Garcia Márquez comentou ter sido a época em que foi quase completamente feliz. “Gostaria que minha vida fosse como naqueles anos em que escrevi ‘O amor nos tempos do cólera'”, afirmou ao “New York Times”, três anos após a publicação do romance. Nesta obra,  o autor resgata a verdadeira história da paixão de seu pai, também Gabriel, por Luiza, sua mãe. O pai dela  não aceitava a relação e conspirava contra a união. No romance, o casal se chama Florentino e Fermina. “Todas essas coisas para mim são parte da nostalgia. Nostalgia é uma fonte incrível para inspiração literária e para inspiração poética”, observou na mesma entrevista ao “New York Times”.

Além de romancista, Garcia Márquez é contista e novelista de fatura exemplar. Imaginação fecunda e narrativa fluente são marcas definitivas no comportamento de sua escrita. Tem inúmeros contos que participam em importantes antologias internacionais do gênero. Certa vez declarou que suas influências são Virgínia Woolf. Ernest Hemingway, “As mil e uma noites” e seu pai. É dele a frase de que é fácil lembrar quando se tem a memória. Difícil é esquecer quando se tem o coração.

Heróis de Abril

Abril 24, 2014

pro Euclides Cavaco

 Cravo

Deixem-me cantar Abril
E evocar tal heroísmo
Militar junto ao civil
Que derrubou o fascismo.
Prestar aos bravos meu preito
Dizer-lhes Valeu a pena
Os cravos e o tema eleito
Grandola Vila Morena !…

Deixem-me clamar victória
Às nossas Forças Armadas
Pelo seu triunfo e glória
Com o povo de mãos dadas.
Que a hístória jamais olvide
Os militares de excelência
Que incutiram fim à pide
E à maldita prepotência…

Deixem-me exaltar os bravos
Do nosso Portugal novo
Da Revolução dos Cravos
Que trouxe justiça ao povo.
Dando a Abril o sentido
Com coragem e vontade
De abrir com o povo unido
As portas da liberdade !…

CABRAL

Abril 23, 2014

Por Raquel Naveira

Ilustração de Liliane Lililane Gobbo

Ilustração de Liliane Lililane Gobbo

Cabral,
Navegador,
Bom soldado,
Cristão,
Leal,
Chefe ideal
Da esquadra de Portugal.

Partiram as treze naus,
Semanas e semanas no oceano,
Com medo de dragões,
Serpentes aladas
Que brotavam dos sonhos maus.

As caravelas ligeiras
Singravam os mares,
Uma sumira;
De repente, algas marinhas,
Aves nos ares,
De terra à vista, o sinal.

Um tripulante traz a notícia:
Há homens pardos e nus,
Beiços furados com ossos brancos
Como fuso de algodão,
Mas são mansos,
Podem descer afinal.

Trocas de presentes,
Danças,
Flautas,
Chocalhos,
Tambores;
Um localiza o Cruzeiro do Sul,
Outro escreve uma carta,
Outro caça papagaios,
É bela a ilha de Cabral!

A cruz,
Símbolo de fé e posse
É o novo padrão,
Todos oram,
Fazem gestos,
Cantam estranha canção.

Regressa Cabral
Entre tempestades,
Ataques muçulmanos,
Sete naus tragadas,
Destroços humanos
Numa refrega infernal.

Lisboa festeja a frota,
Especiarias,
Porcelanas,
Sedas,
Secretas rotas
É tudo que importa
Para o trono,
Dono de meio mundo,
O rei de Portugal.

Morreu esquecido,
Injustiçado e senil,
Quem era mesmo Cabral?
Que terra selvagem era aquela
De toras de pau-brasil?

UMA LIÇÃO DE CIVISMO

Abril 22, 2014

Por Fernanda Leitão

Recentemente, teve lugar o funeral do ministro das Finanças do governo do Canadá, Jim Flaherty. O funeral saíu da Catedral (anglicana) de St James, a mesma onde a Raínha Isabel participa da missa quando vem a Toronto. Há pouco mais de um mês Flaherty pediu a demissão do cargo,invocando razões pessoais, e soube-se agora, pelos elogios fúnebres, que desejava ter-se demitido já em 2008,  não o tendo feito  por imperativo de consciência: estava tão preocupado com a situação internacional que entendeu ser seu dever manter-se no posto e dar tudo por tudo para que o Canadá não sofresse de recessão nem com a crise que abalou tantos países. Conseguiu o que desejava. E assim, o político deixou o governo, em paz com a sua consciência, para se dedicar à família por inteiro. Mas Deus entendeu dar-lhe o eterno descanso.

Apesar de o governo federal, conservador, ser controverso e ter perdido o estado de graça, o povo deu provas públicas de consternação por esta morte, o que prova ter compreendido o papel positivo do antigo ministro neste período conturbado do mundo e, o que é mais importante, soube separar as águas. A Catedral de Saint James estava apinhada de membros do governo, deputados e senadores, todos eles de écharpe verde em homenagem à origem irlandesa de Flaherty. Todos eles, liberais, conservadores, socialistas e independentes, misturados uns com os outros, unidos pelo mesmo desgosto de verem partir um companheiro a quem o coração traíu. Fora do templo, multidões encheram as ruas a despedirem-se de um homem que soube cumprir.

Tudo isto foi possível porque no Canadá a política pratica-se sem ódio, sem faltas de respeito pelo povo e os seus direitos. Dir-me-ão que é assim por ser o Canadá um país rico. Permito-me discordar. Há países tão ou mais ricos do que o Canadá em recursos naturais: Brasil, Angola, África do Sul, China, India, Rússia, por exemplo. Mas os seus povos são pobres, revoltados, emigram para poderem viver com dignidade. A riqueza desses países está nas mãos de um número restrito de pessoas, sendo a diferença entre ricos e pobres absolutamente escandalosa.

Não é o caso do Canadá, que faz uma politica assente em valores,  respeito e decência. Essa é a sua riqueza maior. O funeral de Flaherty foi uma lição de civismo. O civismo ensina-se e aprende-se: nas escolas, nas famílias.  Bom seria que todos os países o praticassem.

Sessão Solene homenageia Dia da Comunidade Luso-Brasileira

Abril 22, 2014

sessão solene

O dia da Comunidade Luso-Brasileira e o Descobrimento do Brasil, ambos comemoradas em 22 de abril, foram celebrados nesta terça-feira (15/4) em Sessão Solene realizada na Câmara Municipal de São Paulo.

A cerimônia foi uma iniciativa do vereador Toninho Paiva (PR) e contou com a presença dos integrantes do Conselho da Comunidade Luso-Brasileira do Estado de São Paulo. “O Objetivo maior é de não deixar apagar a história do nosso país. Não devemos deixar essa chama de irmandade se apagar. Os portugueses trouxeram uma riqueza cultural muito grande ao Brasil, que deve ser lembrada sempre”, ressaltou o vereador.

Empresários, escritores, jornalistas e artistas que representam a comunidade e fomentam a cultura portuguesa no Brasil foram homenageados. “O dom de admirar é tão prazeroso quanto o dom de ser admirado. Essa homenagem é uma forma também de agradecermos ao povo português por tudo que nos ensinou”, disse o cantor Sílvio Brito.

Para o cônsul geral de Portugal em São Paulo, Paulo Lopes Lourenço, a homenagem é mais do que justa, tendo em vista a importância do folclore português para desenvolvimento do Brasil.

Fonte: www.camara.sp.gov.br

A esta terra que sofre

Abril 17, 2014

por  António Quadros

A esta terra que sofre,
Diminuída, mutilada,
À procura de si própria,
Perdida, abandonada.

Mas ouvi, ó portugueses,
Corruptos ou estrangeiros,
Tontos, traidores, burocratas,
Ingénuos, fanatizados,

E vós também, os fiéis
Da verdade da raiz,
Ouvi o que diz o povo,
Ouvi a voz do país.

Portugal somos ainda,
Porque a semente que outrora
Germinou em terra ingrata,
Há-de reviver agora!

Em cada volta do tempo,
De novo começa o mundo.
Juventude, redescobre
O Portugal mais profundo!

(….)

Transviados, cabisbaixos,
Levantai o vosso olhar!
Pátria antiga, que sofreste
Há mais mar, p’ra além do mar!

(…)

Ó Portugal Ser Profundo, ed. Espiral (1980)

Maquiavelices de Patrícia Galvão

Abril 15, 2014

por Nilto Maciel

Convidei Patrícia Galvão a ler comigo dois impressos recentemente chegados à minha mesa. Não direi aos leitores tratar-se da célebre Pagu. Seria mentir descaradamente. A de meu convívio nasceu em 1996 e mora em Fortaleza. Não sou dado a regressos no tempo nem pratico o espiritismo. Além disso, tenho verdadeiro pavor de me encontrar com personagens como Calígula, Lucrécia Bórgia ou Adolf Hitler. Os opúsculos aos quais me refiro sãoA menina da chuva (Fortaleza: Premius, 2013), do cearense Bruno Paulino, e Entre-textos (Porto Alegre: Vidráguas, 2013), do carioca Luiz Otávio Oliani.

Faz pouco tempo, comentei o primeiro livro de Bruno Paulino. Gostei aqui, desgostei ali; entusiasmei-me com isso, enfezei-me com aquilo. É sempre assim, se não estamos diante de Fernando Pessoa, Kafka ou Machado de Assis. Patrícia não é de só ouvir, caladinha, feito aluna bem comportada: “E agora, com ‘a menina da chuva’, qual a sua visão do escritor?” Tentei brincar, mas logo desisti: “Vejo, longe, garotinha toda ensopada, a chorar, encolhidinha. E o malvado cronista a rir de sua invenção macabra”. Ela não sorriu e deve ter me chamado de idiota.

Voltei à seriedade de sempre: Embora não veja diferenças essenciais entre crônica e conto, percebi em A menina da chuvavontade em Bruno de se aproximar de certo modelo de relato curto: introspectivo, sem deixar de se referir a fatos, ações, movimentos dos seres, como se vê na primeira estória. Vejamos este trecho: ‘Sentado na cadeira de balanço, no alpendre da casa-grande, o velho observa o sol despertando na campina, depois de uma longa noite de chuva’. Ainda há resquícios de crônica: a descrição e a narração do visto e ouvido. Nesse aspecto, ainda se pode ver, com certa clareza, a diferença entre os dois gêneros. Como neste segmento: ‘Vi uma senhora de cabelos brancos num supermercado outro dia fazendo compras (ela comprava xampu). No meio de jovens, crianças e velhos que também estavam no recinto fazendo compras’. Neste, o demiurgo revela o próprio ato de olhar ou de ver, característico da crônica. Se fosse ficção, o revelador do enredo simplesmente teria escrito: ‘Uma senhora de cabelos brancos fazia compras num supermercado’.

A estudante se mostrou exigente: “O conto é mais enxuto ou sintético, sendo a crônica menos acanhada? Não há incongruência nisso? Pois a crônica quase nunca se estende como a narrativa ficcional em seus vários formatos, à exceção dos mais minúsculos”. Rendi-me aos seus argumentos: “Então sejamos menos polêmicos: a segunda obra de Bruno está entre a crônica e o conto”. Patrícia me espicaçou, outra vez: “Ele tende a evoluir da mera dissertação de caráter pessoal até alcançar a fórmula da trama?” Tentei ser menos obscuro: “Não posso fazer referência a evolução; talvez deva pensar apenas em passagem, no sentido de movimento, dar outros passos, saltar o córrego, o riacho, decidir-se pela visão próxima da opinião. Ou deixar a opinião de lado e se dedicar a narrar e descrever. Ou preferir contar a reproduzir as formas dos corpos, as silhuetas, as tintas. Ou expor os traços físicos ou mentais dentro da exposição objetiva ou subjetiva dos fatos, movimentos, ações: ‘Contemplou o céu azul e viu pássaros em voo lento, quase preguiçoso’. Patrícia pareceu ter gostado da citação: “De quem é isto?” Fui inconvincente: “Não sei, quiçá de algum versejador esquecido”.

Larguei o livrinho de capa azul de Bruno e agarrei o Entre-textos. E não perdi tempo com lengalenga: “Oliani é poeta de pura linhagem, se ainda se pode falar em pureza, depois da devastação causada por esta palavra no discurso humano. Sua linguagem nos remonta aos artífices da palavra. E ele sabe bem disso: ‘Toda linguagem / é selva / a ser devastada // toda linguagem / é terra / a ser adubada // toda linguagem é pedra/ a ser limada’. A jovem, de novo, mostrou personalidade: “Ele usa alguns vocábulos evitáveis, sobretudo nestes tempos de preservação da natureza (‘selva a ser devastada’). Quem sabe ficasse melhor: ‘selva a ser visitada’.

Não lhe dei ouvidos: “Visível, do mesmo modo, é sua leitura da poesia contemporânea brasileira, não exatamente os medalhões (existem medalhões na poesia brasileira de hoje?). Você conhece alguns?” Ela se mostrou sincera: “Não muito notáveis assim. Poderia chamar de bardos renomados ou de fino lavor, como se dizia antigamente”. Brinquei: “E quem é você para se lembrar de antigamente?” Ela entendeu a brincadeira e eu me senti disposto a me estender no assunto: “Alguns deles são muito conhecidos no nosso meio e chegam a ser quase celebridades: Antonio Carlos Secchin, Astrid Cabral, Ferreira Gullar, Olga Savary, Pedro Lyra, Raquel Naveira, Tanussi Cardoso, se quisermos citar somente sete nomes”. Ela quis outras informações: “Trata-se de antologia pessoal de Oliani? Ou de seleta de cantos de diversos literatos brasileiros de hoje?” Não expliquei: “Deixemos isso por conta e risco dos comentaristas menos apressados. Isto aqui não vai além de menção à publicação, simples registro”. Ela não se rendeu ao meu raciocínio: “O que é este livro então?” Precisei pensar em objetividade: “Como explica Pedro Lyra, o menestrel Oliani simplesmente procurou composições de outros autores e realizou associação de ideias com as de sua lavra”.

Dirigi-me até a porta da sala, a fim de me orientar melhor. E ouvi certo sussurro maquiavélico: “Oliani é bom poeta?” Não titubeei: “Ora se é. Nem precisa perguntar”. Ela me incomodou novamente: “E os outros?” Voltei ao assento, disposto a ser bravo até o fim: “São igualmente vates inspirados ou talentosos. Pelo menos, os poemas reunidos no volume são merecedores de adjetivos pomposos. Antológico é um deles, embora muito desgastado. Tudo virou antológico”.

 

XLVI

Abril 14, 2014

Por Lúcia Helena Alves de Sá

Chega de trepadeiras
e sonetos
à cama
fartei-me de risos

teu sentido quero
ao rio
não quero mais
teus gozos de delícia

quero à margem quiçá
da vida digas
o que é a norma do dia
e a paixão da noite

Hoje lembrei do amor
Eu leve de azul
À espera por teu pelo
e tu em seu habitual teatro

em cena galante
meus olhos a fitar
mas a que tempo
segura meu destino?

Por onde caminha meu zênite?
Ao silêncio
o que dorme em mim
tuas mãos

em meu mel
teu viço
todas as coisas tu
amor meu ordena

consagrei-me primavera
mas… o que é o teu canto
senão razão da
insônia ao sangue?