SOCIEDADE AMIGAS DO LIVRO – SAL – CINQUENTENÁRIO DE FUNDAÇÃO – 1961 – 2011

 APRESENTAÇÃO DO CONFERENCISTA

JOSÉ PAULO CAVALCANTI FILHO

E O LIVRO DE SUA AUTORIA

Fernando Pessoa: uma quase autobiografia

por Beatriz Alcântara

Recomendaram-me cinco minutos para a apresentação do conferencista e sua obra dentro do programa festivo pelo ano qüinquagésimo da Sociedade Amigas do Livro – SAL. Argumentei sobre a escassez do tempo, sem o menor sucesso, mas contas feitas, reconheço ser devido ao convidado, o escritor JOSÉ PAULO CAVALCANTI FILHO, poder evidenciar a cultura extensa, todo o brilho da sua inteligência e o dom da expressão ágil e persuasiva.

Aceitei a incumbência, relevei a curta demora e eis-me entregue à missão, com inteiro agrado.

Bom número de pessoas tem-me pedido opinião sobre o prestigiado e mediático livro Fernando Pessoa: uma quase autobiografia. Sei porque fazem a pergunta com tanta frequência. Vivemos dias regidos pela estética do olhar, do imediato e da micro-leitura onde mal se lê a primeira linha escrita, já se avizinha a conclusão na seguinte.

Temos hoje, para apresentar, uma obra alentada, Graças a Deus, imensamente extensa para ser nossa boa companhia na solidão dos tempos livres, um livro humano e excêntrico como poucos estudos pessoanos publicados ousaram sê-lo.

Na leitura, que prazer! As palavras correram céleres por entre páginas e mais páginas, eu leitora seguindo-lhes a traça, vezes o ardil, divagando ao sabor do texto, tão íntimo de Paulo e Fernando, por tão próximos se encontrarem o autor José Paulo com a criatura ilustre, Fernando Pessoa.

A cumplicidade literária e o devaneio consumiram todo meu ser. Apercebi-me sentada num banco de madeira sob o jacarandá florado de azul no Largo de São Carlos. Por instinto, a emoção voltou meu olhar à direita, detive-me no edifício berço pessoano, o de número quatro, agora alojando a banca advocatícia do mais renomado ex-Forcado Amador de Santarém. Ah, pudesse eu ter vivenciado este mesmo espaço pelo trabalho quotidiano!

A lírica, a ópera e a música erudita ocupam o extremo oposto da praceta, o Teatro de São Carlos cuja fachada ainda sendo sempre a mesma, austera, em nada intimida a miudagem inquieta conduzida por mestres em visita de escola secundária.

O livro, voltemos ao livro, seu autor e o personagem principal: Fernando Pessoa: uma quase autobiografia, JOSÉ PAULO CAVALCANTI FILHO e o escritor múltiplo, enquanto único, FERNANDO ANTÓNIO NOGUEIRA PESSOA.

O autor pernambucano, advogado e ex-ministro da Justiça, traz à cena um livro que de tão sério na moção, envolve e firma o leitor pela condução da proposta a ser revelada. A imensurável pesquisa do livro Fernando Pessoa: uma quase autobiografia, não nos dá a conhecer apenas o poeta como um personagem em busca do conhecimento e da ideação. A vasta investigação de Cavalcanti conduz-nos além, ao intricado processo da razão múltipla.

A proximidade do Autor pernambucano com Pessoa é de teor tão elevado que, em diversas passagens da sua obra, ele adentra o cosmo heteronímico envolto por uma sorte de interseccionismo literário e, se diria, um interlocutor pessoal do poeta, tal alguns predecessores dos tempos juvenis, ou apenas um amigo confessional investido dos poderes demiúrgicos de autor implícito, como acontece na exemplar polêmica entre os heterônimos Álvaro de Campos, Ricardo Reis, Alberto Caeiro e o semi-heterônimo Bernardo Soares, a propósito de poesia e prosa.

JOSÉ PAULO, o escritor artífice, pesquisou, introjetou, recortou e veio a montar, com passagens esparsas de textos heteronímicos extraídos do número um da revista Athena um relato instigante que agora em parte se transcreve, citando o cosmopolita Álvaro de Campos: …como dizer é falar, e se não se pode gritar falando, tem de se cantar falando. Como a música é estranha à fala, sente-se música na fala dispondo as palavras de modo que contenham uma música que não esteja nelas, que seja, pois, artificial em relação a elas. É que para Reis, a poesia é uma música que se faz com idéias, e por isso com palavras… quanto mais fria a poesia, mais verdadeira. Reis fica furioso, considerando ser Campos, só um grande prosador, um prosador com uma grande ciência… e Bernardo Soares, que à poesia em versos prefere a prosa que engloba toda a arte.

Assim como o mestre Caeiro despertou, confessadamente, nos demais da “tróica” heteronímica uma teoria estética individual, na procura interior em busca de uma poética na sua relação com o exterior, por difícil potencializar o denso sentir pessoano, transcrevo outra vez Campos, citado por José Paulo, Mestre Caeiro, voltei à tua casa do monte. E vi o mesmo que viste, mas com os meus olhos.

Assim Fernando Pessoa, ele próprio, ao franquear a revelação do seu existir complexo e vário, permitiu que a inventividade de nosso conferencista se aproximasse do que poderia ser uma quase irrevelada figura literária do poeta multifacetado que tanto potencializou a expressão do sentir e do pensar, na primeira metade do século XX.

Expresso agora, o tempo chegando ao limite, os agradecimentos, em meu nome e de minhas companheiras da SAL, e reitero o quanto nos sentimos gratificadas pela aquiescência do ilustre Dr. JOSÉ PAULO CAVALCANTI FILHO em ter anuído dividir, por esta noite, os prazeres e a glória que sua relevante pesquisa, de grande envergadura pessoana, granjeou no universo literário.

Agradecimentos, ainda, a quantos acorreram ao chamamento para comemorar o cinquentenário de atuação incessante por um grupo de mulheres amigas do livro, a Sociedade Amigas do Livro.

Bem haja a todos!

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